ALBERTO BITTENCOURT - Palestrante, motivador, consultor, escritor, biógrafo pessoal

ALBERTO BITTENCOURT - Palestrante, motivador, consultor, escritor, biógrafo pessoal
ALBERTO BITTENCOURT - Palestrante, conferencista, motivador, consultor, escritor, biógrafo pessoal

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

ÉTICA NA MEDICINA




ÉTICA NA MEDICINA
Alberto Bittencourt - fevereiro de 2014




Médica cubana Lourdes Mann, do programa Mais Médicos

O depoimento da médica cubana Lourdes Richarson Mann atuando no programa "Mais Médicos", em Cristal, no RGS, em entrevista publicada no G1, traçou, em poucas palavras, uma ligeira comparação entre a medicina do Brasil e a de Cuba. Mostrou que um poço profundo separa os dois países. Não se trata aqui de fazer apologia ao regime cubano, longe disso, pois para mim, Cuba é uma ditadura selvagem, aferrada ao poder há sessenta anos, que fuzilou milhares de pessoas no "Paredon". Também não comparo o desenvolvimento tecnológico de um ou de outro país, já que nesse ponto estamos muitíssimo mais adiantados. Tampouco comparo a formação dos médicos, a qualidade do ensino. Nem quero falar do aspecto profissional, da dedicação, do cumprimento do dever, do respeito ao juramento de Hipócrates. 

O que eu quero comparar é o sistema, numa carreira em que o humanismo fala mais alto que o dinheiro, numa profissão em que a maior recompensa é a prática do bem, do ato de curar, cujo objetivo é a saúde, ou o completo bem estar do cidadão. Das palavras da médica cubana, se depreende que, o que faz toda essa diferença é uma palavrinha: AMOR!

FALTA AMOR NO BRASIL, DISSE A MÉDICA CUBANA:
Conheço muito pouco sobre a educação daqui. Sei muitas coisas sobre o lado da saúde. Alguns dias atrás, por exemplo, atendi uma criança com suspeita de apendicite, algo grave, portanto. Me orientaram a ligar para o hospital mais próximo para saber se eles tinham vaga para internar aquela criança. Em Cuba, casos como esse não precisam de formalidades, de pedidos, para internação de urgência. Encaminhamos ao hospital e o atendimento é feito na hora, porque ela não pode esperar. Corre riscos... Pedir permissão para internar em casos de urgência? Isso não existe por lá. Fiquei sabendo que pessoas entram na Justiça para conseguir um leito aqui. É um absurdo. O Brasil vive um problema de falta de caridade humana. É isso que falta para as pessoas. Falta amor ao próximo.

Falta amor no trato com os seres humanos, frequentemente tratados como algo indefinido, chamado "paciente". 

Foi preciso que uma mulher, vinda de seu país para trabalhar no Brasil, em regime de semiescravidão, ganhando 30% do que o governo paga aos outros médicos, sendo que os 70% restantes vão para... o governo de seu país. Pois bem, essa médica simples, vinda de um lugar pequeno, para trabalhar no interior, em locais de poucos recursos, nos ensinou a maior lição: O Brasil vive um problema de falta de caridade humana – o que é a mais pura realidade, pois a medicina hospitalar no Brasil, como em outros países, é em geral, inumana.

No Brasil, o paciente é obrigado a esperar numa fila, de madrugada, ainda escuro, para poder ser atendido, já que há mais doentes do que médicos ativos. E, muitas vezes, após horas de espera, ouve que as consultas estão encerradas, que acabou o expediente. E o pobre homem precisará voltar no dia seguinte, mais cedo ainda, na esperança de ser atendido.

Falta amor, quando o hospital se recusa a atender um paciente que está enfartado, teve parada cardíaca, ou precisa de um marca passo, porque o plano de saúde não autorizou o procedimento de emergência, só o fazendo após liminar da justiça. 

Falta amor, quando se sabe que plano de saúde, no Brasil, só funciona, em muitos casos com mandato de segurança. Todo mundo, de tão habituado, não consegue mais enxergar isso como peja, como aberração, já até considera normal ter que acionar a justiça para ser atendido. 

Outro dia, um motorista de taxi contou-me que encostou a cabeça em algum lugar e contraiu um parasita que provocou uma queda de cabelo localizada, em forma de roda. Resolveu procurar uma clínica popular. Pagou adiantado, R$ 50,00 pela consulta ao dermatologista. 

Ao ser atendido, o médico, sentado estava, sentado continuou. Sem levantar os olhos, perguntou: Qual o seu problema? O taxista respondeu: Doutor, tô com uma coisa na cabeça que fez cair o cabelo nesta roda aqui, ó. O médico não se mexeu do lugar. Pegou o bloco de receitas e disse: Vou prescrever um medicamento para você tomar. Escreveu o nome do remédio, entregou-lhe a receita: Passe bem! 

A consulta não durou 5 minutos. O taxista saiu da sala, chegou na recepção e, pediu à recepcionista a devolução da quantia paga. Como? perguntou, perplexa a atendente. Quero meus cinquenta reais de volta, insistiu o homem. Ao que ela retrucou: Mas o senhor foi atendido, não podemos devolver o dinheiro. Então, ele, muito aborrecido, respondeu: Não fui atendido coisa nenhuma, o médico nem me examinou! Mas o senhor não está com a receita que o Doutor lhe deu, em mãos? – Com a receita, estou, mas isso que ele escreveu não tem valor, pois ele nem me examinou, quero meu dinheiro de volta. Furioso e já levantando a voz: É melhor me devolver, eu não vou pagar por uma coisa que não recebi, caso contrário, vou à polícia, vou aos jornais, vou fazer um escândalo. Ante a insistência, chamaram o médico que achou melhor devolver o dinheiro. 

O taxista saiu dali e se encaminhou a outra clínica. Dessa vez pagou R$ 60,00. O médico veio com uma lupa, sob um foco de luz, examinou com cuidado e detalhe a lesão, fez perguntas. Disse: O sr. contraiu um fungo. Vou receitar um antibiótico. E prescreveu o medicamento. Satisfeito, o taxista comprou o remédio e o está tomando.

O fato é verídico e me foi contado pelo próprio paciente, o motorista de táxi. É triste, mas não é só falta de profissionalismo, é falta de amor, principalmente, amor ao próximo.

Essas clínicas populares existem e são um bom negócio para os empreendedores, porque é melhor receber o preço da consulta na hora, do próprio paciente, do que ter que esperar 5 ou 6 meses para receber um valor aviltado, do SUS.

Outro dia, acompanhei a visita de uma ONG suíça chamada Association Enfants du Brésil - Associação Crianças do Brasil - a um conjunto habitacional do Programa Minha Casa, Minha Vida. Eles vêm todos os anos ao Brasil, trazem ajuda para creches e instituições que cuidam de crianças. Visitam sempre as casas das famílias, na favela do Bode, no Pina, construídas sobre palafitas na maré. Como muitas haviam sido removidas, fomos ver como estavam nos novos apartamentos. São apartamentos pequenos, de dois quartos, mas dignos, em blocos de 4 pavimentos cada, com água encanada, esgoto, luz elétrica, higiênicos e bem construídos. 

Entramos num dos apartamentos. A moradora Eliane e seus 3 filhos, sem marido, reclamou, pois agora tem que pagar o condomínio, luz, água, esgoto, além de uma pequena prestação mensal. A nova vida ficou mais cara, dignidade também tem preço. Com um braço na tipóia, perguntamos o que havia acontecido. Fraturei o braço numa queda. Fui à UPA. Tiraram uma radiografia, aqui está. Marcaram minha volta para daqui a 60 dias. Mostrou a radiografia. Quando olhei, fiquei abismado. Estava lá, bem claro: os dois ossos do antebraço, fraturados, desalinhados, as extremidades com um afastamento de mais de um centímetro. 

Como pode? pensei, dentro de dois meses estará tudo calcificado. Aí então, precisarão fazer uma cirurgia, quebrar o calo ósseo, fixar com parafusos, depois engessar o braço, imobilizando-o. 

Reparem, não foi preciso nenhum médico para ver isso. Eu fiquei indignado e a mulher, coitada, resignada, fazia os serviços domésticos como podia, sem a ajuda de ninguém. Absurdo dos absurdos! Quanta desconsideração com um ser humano, tratado pior que bicho. Imaginem, dois meses com um braço quebrado, sem a menor assistência. Que falta de consciência, de amor ao próximo, de zelo pela vida humana. Segundo a médica cubana, tal não aconteceria em Cuba.

Precisamos mudar esse quadro. 
Precisamos gritar, cobrar, pressionar. 



Infelizmente a Medicina Pública no Brasil se tornou inumana. Os doentes são negligenciados em macas nos corredores, nos leitos dos hospitais, ou até no chão, humilhados, inúmeras vezes maltratados.

É deplorável a falta de pessoal especializado, em todas as áreas. Pouquíssimos são os hospitais e postos que contam com o trabalho de psicólogos e especialistas no seu funcionamento diário. Não podemos nos esquecer de que o ato de curar passa por pequenas atenções, gestos de carinho e cuidados, uma palavra amiga, um sorriso. 

As reclamações, pelo péssimo atendimento, são comuns, tão comuns que se tornaram rotina e, da rotina passou a ser a norma, a atitude usual. A desumanização é corriqueira nos hospitais, em que uma pessoa fragilizada, só recebe indiferença. Os mais vulneráveis são os idosos, as pessoas gravemente enfermas, as crianças, as parturientes nas urgências médicas.

O que nos espera, a todos nós, quando o trabalho de médicos e enfermeiras perde a dimensão humana? 



Emergência do Hospital Salgado Filho -  Rio de Janeiro.
Paciente no chão
Foto de OGlobo.Globo.com

Hospitais insuficientes, desaparelhados, sem manutenção, sem pessoal em quantidade necessária para a atender a um número cada vez maior de doentes, fingindo que curam para o governo fingir que faz uma saúde minimamente decente é o quadro com que nos deparamos todos os dias.


Marie de Hennezel
Segundo a psicóloga francesa Marie de Hennezel, autora de dois best sellers - "La Mort Intime" (Robert Laffont, 2001) e "Le Soucis de  l'autre", obras de referência no relacionamento paciente-hospital, uma medicina humana tem que se preocupar com o doente, antes de se preocupar com a doença. Ou se tratam dos pacientes como gente, diz ela, ou os governos vão gastar cada vez mais com pessoas estressadas pelo atendimento, pela demora, pelo desgaste com os sintomas das doenças, a cada dia mais debilitados.  
E assim, essas estórias se repetem. Hennezel afirma que é preciso levar em conta não só a doença, mas, principalmente o doente e acreditar em sua capacidade de se superar, de enfrentar a enfermidade, de curar-se. Com um estímulo, uma injeção de ânimo, a melhora de sua auto estima, ele pode se tornar capaz de mobilizar sua força interior. Precisamos ter consciência de que entre o médico e o paciente existe uma relação de reciprocidade. Os hospitais são desumanos porque a especialização médica esquece que os seres humanos são complexos e nosso organismo é por si só, uma rede interligada, ultraperfeita, em que, a cada ação corresponde uma reação. Sem a ação do estímulo, nunca haverá reação na luta contra o mal.

Continua a psicóloga: os médicos fazem o que lhes ensinaram. Suas competências são técnicas, científicas. Falta porém, em sua formação, a inclusão da visão holística, que considera o ser humano no seu conjunto: físico, mental, emocional e espiritual. Para ser um profissional da área de saúde, não basta ter uma boa formação técnica, mas é preciso priorizar o lado humano do atendimento, o cuidar com amor, com atenção, daquele ser humano que está em suas mãos. 

Hennezel finaliza: O que ensinam aos médicos é que não podem se deixar envolver emocionalmente com os doentes, que têm que deixar de lado todo e qualquer espécie de sentimentalismo nos tratamentos. Mas, é isso, precisamente que deve mudar, diz ela. O poder público, os Ministérios da Saúde, da Educação, devem decretar oficialmente que a relação humana faz parte do tratamento e é indispensável à cura.

Em resumo, olhe nos olhos de seu doente, trate-o com doçura e isso fará toda a diferença.



x-x-x-x-x-x

             .
           
 

                     

Nenhum comentário: